Argentina: pobreza recua e atinge 11,3 milhões em 2024; situação afeta 38,1% da população
Resultado do segundo semestre representa um recuo em relação aos 52,9% do primeiro semestre. Pobreza também ficou menor do que no fim de 2023. Javier Milei e...

Resultado do segundo semestre representa um recuo em relação aos 52,9% do primeiro semestre. Pobreza também ficou menor do que no fim de 2023. Javier Milei em março de 2024 Agustin Marcarian/Reuters O número de argentinos vivendo abaixo da linha da pobreza caiu no segundo semestre de 2024. Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec), a situação afeta 11,3 milhões de pessoas, cerca de 38,1% da população. Houve uma redução de 14,8 pontos percentuais (p.p.) em relação à taxa de 52,9% do primeiro semestre do ano passado, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec). Com o resultado, o presidente argentino, Javier Milei, fecha o primeiro ano de mandato com um índice de pobreza menor do que o de 2023, que era de 41,7%. O Indec considera que: Um argentino abaixo da linha da pobreza é aquele que tem dificuldade em acessar os itens e serviços de necessidades essenciais, como alimentos, roupas, transportes e saúde. A situação de indigência é caracterizada pela impossibilidade acessar uma cesta básica e suficiente para suprir as necessidades diárias de energia e proteína. A pesquisa também aponta uma redução na taxa de pessoas em situação de indigência: de 18,1% no primeiro semestre para 8,2% no segundo, uma redução de 9,9 p.p. A pesquisa abrange 31 aglomerados urbanos da Argentina, e mostra também que os mais pobres do país são os mais jovens. A pobreza atinge 51,9% de todas as pessoas com idade de zero a 14 anos. Já entre o grupo de 15 a 29 anos, a taxa de pobreza é de 44,9%. A incidência da pobreza diminui bastante nos grupos de pessoas mais velhas: atinge 33,6% daqueles com idade entre 30 e 64 anos e 16% das pessoas acima dos 65 anos. Olhando para as famílias, sem considerar a quantidade de pessoas que a compõem, a pobreza atinge 28,6% dos lares, uma redução de 13,9 p.p em relação ao primeiro semestre. Já as famílias em situação de indigência são 6,4% do total de lares argentinos, queda de 7,2 p.p. REPORTAGEM ESPECIAL: g1 mostra o que mudou na vida e na economia do país, um ano após o Plano Motosserra Argentina de Milei: o que mudou um ano após o Plano Motosserra Por que a pobreza caiu na Argentina? A Argentina viveu um ano de mudanças profundas na economia em 2024, o primeiro do mandato do presidente Javier Milei. Antes mesmo da virada do ano, ainda nos últimos dias de 2023, Milei anunciou o "Plano Motosserra", um pacote de medidas duras que promoveram diversos cortes de gastos no país, que tinha como principal objetivo reduzir a inflação galopante da Argentina. Até o fim de 2023, a inflação anual do país batia os 211,4%. Em seu discurso de posse, Milei avisou que o país viveria um período difícil para depois se recuperar. "Não há alternativa ao ajuste e não há alternativa ao choque. Naturalmente, isso impactará de modo negativo o nível da atividade, o emprego, os salários reais, a quantidade de pobres e indigentes", afirmou. Entre as principais medidas, o pacote de Milei: Eliminou os subsídios governamentais para serviços básicos, como luz, água e transportes públicos; Eliminou uma lei que limitava os aumentos de preços em produtos da cesta básica nos supermercados; Congelou obras públicas; Demitiu milhares de funcionários públicos; Diminuiu o reajuste dos salários, aposentadorias e pensões; Iniciou estudos e processos de desestatização e privatização de empresas estatais; Abriu a economia da Argentina para mais exportações e importações. O maior impacto veio do fim dos subsídios às contas básicas e do controle de preços, que fizeram explodir a inflação em um primeiro momento. Em novembro de 2023, o índice foi de 12,8%, já altíssimo. No mês seguinte, primeiro de vigência das medidas, passou a 25,5%. Em março de 2024, a inflação argentina chegou ao pico de 287,9% na janela de 12 meses. "A eliminação dos subsídios de luz e gás geraram um aumento muito grande em contas essenciais para famílias e comerciantes. Isso gerou um repasse nos preços e pressão sobre toda a inflação", explica Carlos Bermani, professor de economia da Universidade de Buenos Aires (UBA). Ao mesmo tempo, o governo Milei congelou os reajustes do salário mínimo e paralisou obras públicas. Os custos subiram, a economia se contraiu e o desemprego subiu. Foi esse o combo necessário para reduzir a atividade econômica do país — que se contraiu 1,4% no primeiro trimestre de 2024 e 1,7% no segundo — e deixar muita gente na pobreza, os 52,9% da população. Com o choque inicial das medidas, o consumo menor fez com que a inflação fosse se acomodando. A partir de abril, a inflação argentina deixou de ter dois dígitos mensais, até chegar à casa dos 2%. Encerrou 2024 com uma taxa anual de 117,8%. O controle da inflação promoveu o início de uma estabilização da economia, que se traduz em maior confiança dos consumidores argentinos. Além disso, com esse controle, os aumentos salariais também começaram a dar conta de acompanhar a variação bem menor nos preços de bens e serviços, dando maior poder de compra para a população. Segundo o Indec, do primeiro para o segundo semestre, houve uma alta de 64,5% no número de famílias que conseguem comprar uma cesta básica, principalmente por conta de uma inflação mais controlada. No período, o preço médio da cesta básica alimentar teve uma alta de 22,2%, enquanto a cesta básica total, que engloba outros serviços básicos, subiu 26,7%. A renda familiar média das famílias abaixo da linha da pobreza) foi de quase 600 mil pesos no segundo semestre, enquanto o preço médio de uma cesta básica total é de cerca de 952 mil pesos. A diferença entre a renda e o valor da cesta ficou em 37%. Apesar de uma taxa alta, essa diferença registrada no segundo semestre é menor do que a do primeiro, de 42,6%. O controle da inflação, além de ajudar a reduzir a pobreza, também voltou a aquecer a economia do país. O PIB argentino caiu 1,7% em 2024 em relação a 2023, principalmente pelo período de "choque econômico" vivenciado no primeiro semestre. No entanto, a economia do país teve um segundo semestre mais positivo: no terceiro trimestre, a atividade avançou 4,3%, e no quarto, 1,4%. Os desafios para o futuro da Argentina Para 2025, segundo o analista financeiro Luis de Dominicis, os desafios de Milei são conseguir atrair mais investimentos (principalmente estrangeiros) para o país e conseguir manter sua popularidade entre a população. Milei sabe que, se a economia não concluir seu trajeto de recuperação em 2025, “a paciência e confiança das pessoas poderia acabar”, lembra Dominicis. A Argentina tem eleições para escolher novos deputados e senadores em 2025. Se o governo perder popularidade até lá, a composição do Congresso argentino pode atrapalhar os planos e travar a aprovação de propostas essenciais para os planos de Milei. Para Dominicis, a queda da inflação ajuda a proporcionar mais estabilidade e confiança para que a população volte a consumir, mesmo que aos poucos. Já os cortes de gastos devem ser recompensados com a confiança dos investidores, que já estão colocando dinheiro na Argentina.